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quinta-feira, abril 25, 2024

Prometida por presidente da Câmara, comissão para mudar lei antidrogas não saiu do papel

Em meio à crise de segurança e à superlotação do sistema carcerário, a Câmara dos Deputados espera há mais de dois meses a criação de uma comissão para discutir a revisão da Lei Antidrogas. A criação do colegiado foi prometida pelo presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), mas ainda não saiu do papel.

Pelo acordo, o deputado Paulo Teixeira (PT-SP) seria o relator e Marcelo Castro (DEM-PI) o presidente do colegiado. A discussão partiria do projeto de lei 7187/2014, que pede a liberação do plantio de maconha e a comissão “teria poderes amplos para alterar a lei de drogas”, de acordo com Paulo Teixeira.

Há 147 projetos de lei em tramitação na Câmara que alteram a Lei 11.343, de 2006, que institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (Sisnad). Muitos pedem uma punição mais rígida para o crime de tráfico, como aumentar a pena.

Criada a princípio para abrandar o tratamento penal dado ao usuário, na prática, a legislação leva muitos usuários a serem enquadrados como traficantes, o que contribui para o superlotamento das prisões.

De acordo com balanço mais recente do Departamento Penitenciário Nacional, de 2014, a população carcerária era de 622 202, mas havia apenas 371 884 vagas no sistema. Desse total, 28% dos detentos respondiam ou foram condenados por crime de tráfico de drogas, delito mais recorrente.

Pela atual legislação, para definir a pessoa detida com drogas é um usuário ou traficante, o juiz leva em conta a quantidade apreendida, o local, as condições em que se desenvolveu a ação, as circunstâncias sociais e pessoais e a existência ou não de antecedentes. Esses critérios são os mesmos usados pelos policiais e pelos promotores.

Usuário ou traficante?
Como a lei não determina qual quantidade deveria ser considerada tráfico, a avaliação feita pelas autoridades responsáveis muitas vezes leva ao encarceramento da população mais pobre e negra, de acordo com a crítica de especialistas.

Um caso emblemático recente é do ex-catador Rafael Braga. Detido em janeiro de 2016 na comunidade onde morava no Rio, ele foi questionado sobre informações de tráfico de drogas na região e disse não tê-las, mas foi levado para a delegacia. De acordo com a defesa, tratou-se de um flagrante forjado. Em abril, Rafael foi condenado a 11 anos de prisão por tráfico de drogas e associação ao tráfico.

No processo, a acusação foi baseada apenas na palavra do policial que o prendeu, mesmo havendo uma testemunha que o desmentia. Isso porque a Súmula 70, uma diretriz da cúpula do Tribunal de Justiça do estado do Rio de Janeiro, dá total poder à palavra dos policiais no momento do julgamento.

O projeto de lei 7024/2017, em tramitação na Comissão de Segurança, é um dos que altera a Lei Antidrogas para estabelecer que serão nulas as sentenças condenatórias fundamentadas exclusivamente no depoimento de policiais.

De acordo com Marcelo Castro, a intenção da comissão é fazer um amplo debate, com parlamentares e entidades com as mais diversas visões, contemplando tanto a perspectiva da saúde quanto a da segurança.

“As drogas acompanham a humanidade desde que ela existe e tudo indica que vai continuar assim, então temos de ter uma visão realista”, afirmou ao HuffPost Brasil. De acordo com o deputado, que foi ministro da Saúde, é preciso encontrar mecanismos para que as drogas causem menos estragos e analisar experiências bem e mal sucedidas em diversos países.

Maconha medicinal
A discussão na comissão deve se centrar na criação de um novo projeto de lei voltado para dois pontos: permissão do uso e cultivo da maconha para fins medicinais e descriminalização do usuário, de acordo com Gabriel Elias, coordenador de Relações Institucionais da Plataforma Brasileira de Política de Drogas, que tem acompanhado a articulação para criar o colegiado.

“O ônus da prova deve ser de quem acusa. Hoje em dia o que acontece é o contrário. Se o usuário é pego com drogas, ele tem que provar que é usuário e não traficante”, afirma Elias.

Pesquisa feita pela Plataforma publicada em 2016 mostra que 68% dos deputados acredita que o usuário de drogas não deve ser criminalizado. Entre os motivos apontados para não criminalizar o usuário, 48% disse que ele é vítima ou doente, 12% porque não causa danos e 10% que o tráfico é que deve ser reprimido.

Sobre o uso medicinal da maconha, 46% entende que todas as possibilidades de uso terapêutico da planta devem ser permitidas, 36% acredita que apenas o canabidiol deve ter seu uso médico permitido. Outros 11% são contra qualquer permissão e 8% não respondeu.

Já para 54%, o comércio e a posse de maconha devem ser considerados crime. Outros 18% afirmou que cabe ao Estado regular a produção e a venda da droga e para 8% a produção e o comércio devem ser legais apenas para consumo adulto. Outros 21% não responderam.

De acordo com o especialista, o uso medicinal da maconha precisa ser definido por lei porque as permissões da Anvisa ainda são insuficientes, uma vez que tratam da liberação da importação de substância e não da produção, o que torna os valores proibitivos para muitas famílias.

A Lei 11.343 proíbe plantio, cultura, colheita e exploração de Cannabis, “ressalvada hipótese de autorização legal” para fins medicinais e científicos, em local e prazo predeterminados e mediante fiscalização.

Uma ação em discussão no Supremo Tribunal Federal (STF) analisa a liberação irrestrita da maconha para fins medicinais e terapêuticos. Em agosto, o presidente Michel Temer encaminhou à corte parecer da AGU (Advocacia Geral da União) contrário à liberação.

Na avaliação de Elias, a regulação do consumo da maconha seria um primeiro passo para um aperfeiçoamento da política sobre drogas.

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