GERAL

Zaid Arbid se despede da profissão após 45 anos

Após 45 anos advogando em Mato Grosso, conhecido por atuar em casos polêmicos e de grande repercussão, o advogado Zaid Arbid, 70, encerra sua trajetória nesta segunda-feira, 1º de junho. Zaid estima que nestes quase 45 anos, atendeu quase mil clientes.

Entre os casos que Zaid Arbid atuou e mais ganharam destaque na mídia estão em 1994 o do juiz José Geraldo Palmeira, envolvido no favorecimento nos presídios de Pascoal Ramos, Carumbé e Agrícola das Palmeiras, na aposentadoria compulsória deste, em 2004, após acusação de envolvimento em um plano para facilitar a fuga de uma grande traficante. Na lista de clientes também estão políticos como Jonas Pinheiro, Gilmar Fabris, Ondanir Bortolini, o Nininho. Há agropecuaristas, como é o caso do pioneiro e plantador de arroz em Mato Grosso, Wellington Mercante Campos, que inclusive foi quem vendeu as primeiras terras a André Maggi.

E, é claro, João Arcanjo Ribeiro, que Zaid afirma ter sido um cliente que lhe ofereceu desafio profissional e produziu satisfação pessoal. Destaca o julgamento público antecipado, retaliações estendidas a seus defensores e muitas dificuldades para resgatar a legalidade dos atos processuais. E satisfação pessoal porque garante que conheceu e conviveu com uma pessoa que poucos conheceram e conhecem.

Apesar de não assinar mais nenhuma peça processual e não ir mais a audiências e julgamentos a partir desta segunda-feira, Zaid definiu que fará uma transição de todos os processos aos novos advogados escolhidos pelos clientes, pelo período de um ano. Até 31 de maio de 2021, vai manter seu escritório na avenida Historiador Rubens de Mendonça, em Cuiabá.

Zaid Arbid afirma que a decisão de parar, é sem dúvida alguma pela força do tempo e para poder justamente fazer essa transição. “Acho que não é necessário esperar acender o sinal vermelho. Você se conhece e ao acender o sinal amarelo basta”. Ele afirma ainda não querer “passar do tempo”. “Tenho receio de ficar com aquela conversa pastosa, vencida e repetitiva. Eu acho que não se precisa ir ao sacrifício. O profissional tem que se gostar e respeitar o cliente. Saio porque estou bem e por estar bem é que vou conseguir repassar aquilo que o cliente me confiou”.

Ele destaca que ao longo de todos esses anos, clientes se tornaram amigos e ele terá o prazer de encontrá-los pessoalmente para informar a sua decisão. O que o advogado não queria era uma interrupção abrupta, “pela força maior, sempre sem agenda e traumática”.

“É muito frio você pegar uma pasta e devolver. A pessoa quer informações. No andar das ações, uma coisa ou muitas das coisas você sabe por que fez daquele jeito e quem vai assumir quer saber onde você quis chegar. Toda defesa tem um começo, um meio e um fim. Tem um silogismo natural nisso. Eu acho ser o senso de gratidão que tenho. Vou parar, mas não vou deixar o cliente sem a informação e sem a prestação de contas dos serviços”.

Sem nenhuma punição disciplinar, sem ter sido envolvido em nenhuma investigação policial ou ação criminal, se despede da profissão com leveza. “Entro e saio pela porta da frente”.

Sobre o que vai fazer, Zaid diz que ainda é cedo para pensar, que é precipitado. “Entre a terra e o mar tem a praia e eu vou caminhar nesta praia para ver para que lado eu vou, o que eu vou fazer. O tempo é o senhor da razão”.

‘Clínico geral’

Apesar das causas criminais terem levado Zaid às páginas de jornais e às televisões por longos anos, é a advocacia voltada para o direito de posse e para as razões de domínio sua grande paixão. Ele atuou em todas as áreas, desde processo civil, tributário, administrativo. “Me considero realizado porque consegui fazer um pouco de tudo. É bem verdade que você erra mais. Você atuando em mais áreas do direito, você vai errar mais. Acho que hoje a vantagem da advocacia é que ela se especializa e pode oferecer um trabalho de mais qualidade. O campo de atuação é menor e o campo de erro também é menor”.

Zaid enfatiza que a informática revolucionou a profissão, dando possibilidade de atualização constante. Lembra que é da época do mimeografo, do telex, da primeira fotocopiadora, com impressão escura.

“Hoje você digitaliza e está presente no mundo. Os tempos são outros. Eu acho que isso exige mais criatividade da pessoa, principalmente do profissional. Quando se fala que essa evolução vai desaparecer com determinadas profissões, eu discordo. Acho que ela vai aprimorar as profissões. Você tem um doutor google no sapato, ele tira dúvidas, ele resolve aquilo que já é conhecido, mas não cria nada. Por isso acho que o profissional de hoje tem o compromisso da criatividade, o que o jovem tem de sobra”.

Zaid decidiu conhecer Rondonópolis

em 1975 e permanece até hoje

Era 12 de junho de 1975 quando o recém-formado advogado chegava à cidade rondonopolitana

 

Há quase 45 anos, no dia 12 de junho de 1975, o recém-formado advogado Zaid Arbid decidiu conhecer Rondonópolis, onde mora até hoje e vai continuar. Apesar de montar, anos mais tarde, um escritório em Cuiabá, sua casa continuou sendo a cidade rondonopolitana. Na Capital, onde continuará passando dois dias por semana até terminar a transição de todos os seus processos, a moradia foi sempre um hotel.

Zaid Arbid se formou pela Universidade Paulista de Tupã (São Paulo). Ele conta que no último ano do curso de Direito os estudantes sempre se associavam a um advogado. Ele se associou ao advogado Rubens Pires que era responsável pela advocacia do Banco do Brasil. “Ele fazia Andradina, até Prudente e uma parte da alta paulista. Ele tinha um cliente muito grande em Alto Araguaia que se chamava Cândido Musateli, dono da fazenda Ariranha. Rubens me fez uma proposta para eu vir para Alto Araguaia, mesmo antes de concluir o curso. Então, eu ficava acompanhando os processos da fazenda Ariranha e depois vim para conhecer Rondonópolis, onde estou até hoje”.

O advogado Zaid Arbid ressalta que sempre atuou muito com possessória, que este era o carro forte do escritório, mas “sempre regado com um pouco de penal”.

Em Rondonópolis, relata uma “parceria” feita como o advogado Willian Rodrigues Dias. Todas as ações criminais ficam com Willian Dias e Zaid assumia as ações possessórias e civis, apesar de atuarem em escritórios diferentes. “Mas houve mais ou menos uma trégua”.

E é também de Rondonópolis uma das ações que Zaid mais se orgulha de ter ganhado. Foi em 1979, quando existia na cidade uma taxa de contribuição de melhoria que os moradores pagavam para as ruas ser asfaltadas. O cliente Rosalvo, no entanto, não foi procurado para fazer o pagamento quando a rua em frente a sua residência recebeu o asfalto. Uma ação pedia a perda da propriedade e já era dada como causa perdida quando Zaid assumiu. Ele conseguiu anular o edital e o cliente permaneceu com o imóvel.

“Não tem causa perdida, tem causa sem direito. Um advogado de Campo Grande, Nelson Trad, uma vez no Tribunal de Justiça de Mato Grosso, estava ele, eu e o desembargador Odiles, e ele disse que não perdia ou ganhava causa, o cliente tinha ou não tinha direito”.

 

MOMENTOS MARCANTES

Clientes deixaram grande aprendizado

Para quem acha que os clientes que mais marcaram a vida profissional de Zaid Arbid foram aqueles      que deram mais repercussão ao seu trabalho, se engana.

Zaid Arbid afirma que dois clientes são considerados muito especiais porque participaram de momentos marcantes e deixaram grandes aprendizados.

“No início advoguei para Wellington Mercante Campos, de 76 e até os anos 80. Era uma pessoa diferenciada. Carioca, veio plantar arroz em Mato Grosso. Me deixou um legado de vida. Era um visionário. Alienou propriedades para André Maggi. A determinação do Wellington, a visão dele, serviram como bússola para Rondonópolis e Mato Grosso.

O outro cliente, Zaid Arbid afirma que tem uma admiração profunda. Trata-se de Ademar Wurzius, para quem advogou entre 1978 até 2017. “Ele não tinha uma estrutura cultural, mas a experiência e a vontade de viver fizeram dele um vencedor”.

“Esses clientes me inspiraram, talvez pela marca do início e do acertamento pessoal e profissional. Costumo dizer que a mãe de todo o sucesso é a necessidade. Essa faz a pessoa fazer coisas que até ela mesma não se acha capaz”.

 

VENDAS DE SENTENÇAS

Paro sem conhecer o ‘marcado marroquino’

Zaid Arbid considera o Judiciário mato-grossense como referência nacional e afirma que se despede da profissão sem ter conhecido o “mercado marroquino”, se referindo às denúncias de venda de sentenças.

“Posso dizer que nesses 45 anos ninguém me ofereceu uma decisão à venda e nunca comprei e nem negociei. Eu não conheço esse mercado, apesar de haver quem diga existir. Penso que muitos vendem, mas não entregam. Não acredito que um juiz, um desembargador, vai dar a decisão dele por um vil metal. Nunca fui procurado por lobistas, e nem os procurei, porque não acredito”.

Zaid lembra uma situação da época da CPI do Judiciário, em 1999. Em uma conversa, o senador Ramez Tebet afirmou que não acreditava que a venda de sentenças era na proporção que falavam.

Ordem dos Advogados

Todo órgão representativo precisa ter a liberdade e a independência que apregoa também como lição de casa. Já se foi o tempo das capitanias hereditárias. É preciso que a representação da classe seja buscada da vontade direta e não indireta dos advogados inscritos. Existem profissionais exemplares em Mato Grosso, assim conhecidos pelos colegas, mas desconhecidos pelos seus representantes. Deve existir a escolha de todos, na forma de plebiscito, para qualquer indicação aos Tribunais de Justiça, Eleitoral e do Trabalho.

 

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