Preparativos para o Dia de Finados trazem lições de amor à vida

A queda abrupta na temperatura não impediu que muitos rondonopolitanos repetissem uma tradição na véspera do dia de finados. Munidos de baldes, panos, vassouras e rodos, homens e mulheres dedicavam se com carinho à dolorosa e reconfortante trabalho de limpar os túmulos de familiares e amigos já falecidos. Mais do que deixar as lápides bonitas aos olhos dos milhares de visitantes que passarão pelos cemitérios amanhã, a tarefa é uma demonstração de amor.
A reportagem conversou com algumas dessas pessoas na manhã de hoje (01) no cemitério da Vila Aurora, o maior e mais antigo de Rondonópolis. O diálogo revelou impressões diferentes sobre como eles encaram a homenagem aos finados e a inevitabilidade da morte.
Dona Maria Marlene Magalhães chegou ao cemitério antes das sete horas da manhã. A encontramos já concluindo a limpeza do túmulo onde estão os restos mortais do pai, de um irmão e do filho que faleceu aos 22 anos.
Ela nos contou que também iria ainda hoje ao cemitério da Mata Grande, onde está sepultado o marido. O companheiro faleceu há a oito anos depois de ficar um longo período acamado. Foi vítima de um derrame.
“Nos casamos quando eu tinha 15 anos e vivemos juntos por 42 anos. É muito difícil ficar só depois de conviver tanto tempo com uma pessoa, mas não penso em me casar novamente. Ele foi meu único amor”, disse ela.
O cuidado de dona Maria com o túmulo dos familiares impressionava. Parecia que ela estava afagando cada um deles. “Todo ano eu venho. A gente sente muita falta, uma saudade enorme. Aqui vamos recuperando as memórias de como fomos felizes e isso de certa forma acalma o coração”, explicou.
SEM MEDO
Mais à frente encontramos o senhor Milton Dota, um descendente de japoneses que, apesar dos 78 anos, limpava o túmulo com surpreendente jovialidade. No local estão sepultados o corpos do pai, da mãe e do irmão mais velho.
Pragmático, seu Milton aproveitou para reclamar da administração do cemitério. “A gente paga uma taxa de R$ 120 reais por ano, mas eles não cuidam direito. Nós é que temos que fazer isso”.
Começamos a conversar e logo a sabedoria oriental aflorou. Em poucas palavras ele apresentou sua visão sobre a morte, de forma simples e bem humorada.
“A dor (de perder pessoas queridas) sempre existe, mas a morte é uma coisa natural. A gente não vai ficar aqui a vida toda”, afirmou. “Quem quer ver Deus, tem de morrer”, completou entre sorriso.
Seu Milton disse que voltará amanhã com o restante da família, que é católica. Vão participar da Santa Missa e depois irão ao túmulo, para as homenagens tradicionais.
“Precisamos encarar tudo de forma positiva. Não há porque ter medo da morte. Na verdade deveríamos ter medo é de nascer. Enfrentar esse mundo de hoje é difícil”.
Nos despedimos sorrindo. Ele continuou fazendo a limpeza com o mesmo esmero, sem saber que havia iluminado o nosso dia com sua lição de vida sobre a morte.
Eduardo Ramos – Da Redação